sábado, 5 de junho de 2010

Sucessos e Ilusões - Relações Internacionais do Brasil durante e após a Segunda Guerra Mundial



Antonio Penalves Rocha
Profº Dr. do Departamento de História/USP

MOURA, Gerson. Sucessos e Ilusões - Relações Internacionais do Brasil durante e após a Segunda Guerra Mundial. Rio de Janeiro, Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1991.

A simples resenha de um livro é, por força do ofício, um trabalho rotineiro. No entanto, resenhar um livro escrito por uma pessoa respeitada e querida, sob o impacto da notícia da sua morte, torna-se uma tarefa árdua: é preciso substituir o desejo de escrever sobre as emoções provocadas por uma perda pela frieza da apresentação de um texto. Resta, assim mesmo, algum conforto ao encontrar no último livro publicado por Gerson Moura a tradução de alguns aspectos da sua vida profissional, ligados à sua dedicação à pesquisa e à fina interpretação de dados apresentada pela sua escrita leve e inteligente.

De qualquer modo, não posso deixar de lembrar uma das nossas últimas conversas. Diante das dificuldades burocráticas que estavam impedindo a sua contratação pelo Departamento de História da USP, sugeri que tentasse, quando houvesse algum concurso, o Departamento de Política, haja vista o apreço que muitos politólogos tinham pelos seus estudos sobre relações internacionais do Brasil. A sua pronta resposta foi: "não vem ao caso; sou um historiador". É exatamente como um dos mais expressivos historiadores contemporâneos das relações internacionais do Brasil que Gerson Moura deve ser lembrado, embora nos últimos anos estivesse redirecionando suas pesquisas com a preparação de um estudo sobre Historiografia Norte-americana. O Sucesso e Ilusões é uma prova irrefutável desse talento.

Para realizar a análise das relações internacionais do Brasil durante e após a Segunda Guerra, Gerson Moura baseou-se em fontes primárias do CPDOC (arquivos de Getúlio Vargas, Osvaldo Aranha e Souza Costa), do National Archives de Washington e do Public Record Office de Londres.

O livro é formado por uma coletânea de estudos, articulados pelo autor em torno de uma temática e de um período. Assim sendo, ele foi dividido em duas partes. Na primeira, são tratados três temas do período da Segunda Guerra: as razões que levaram Vargas a se aproximar de Roosevelt, a formação da FEB à revelia dos interesses americanos e ingleses e, finalmente, a mudança de orientação do governo americano, retirando o apoio e passando a fazer clara oposição à ditadura de Vargas. Na segunda parte, são analisados o conservadorismo da política externa do Governo Dutra, os desdobramentos políticos das relações militares entre EUA e Brasil no pós-guerra, a aquisição da estrada de ferro Leopoldina pelo governo brasileiro face às pressões inglesas como um episódio decorrente da sua subordinação aos aliados e a debilidade das relações entre Brasil e União Soviética ao longo dos anos de 1945 a 1947.

Além disso tudo, cabe destacar uma linha de reflexão que percorre o livro de ponta a ponta, muito pouco explorada pela historiografia diplomática brasileira. Refiro-me ao destaque dado por Gerson Moura aos reflexos da política exterior que atingem classes e grupos da sociedade brasileira, muito embora "uma distância cósmica" os separe da elaboração e realização dessa política. Deste modo, no período tratado pelo livro, o sucesso residiu no alinhamento, conduzido pelo Estado, da política externa brasileira com os interesses dos EUA: às classes subalternas, submetidas a sacrifícios e à guerra, posto que delas se extraiu o grosso das fileiras da FEB, foi dada a ilusão de que participavam da emergência de um mundo melhor, um dos resultados automáticos da parceria com os EUA.

Revista de História - USP

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