CLAVAL, P. Epistemologia da Geografia. Trad. Margareth de Castro Afeche Pimenta e Joana Afeche Pimenta; Florianópolis: Ed. da UFSC, 2011. 406 p.
Izabela Cristina Gomes da Silva
da Universidade Federal de Pernambuco - Recife - Pernambuco - Brasil
izabela.cristinagomes@gmail.com
O livro inicia-se com o questionamento de como a epistemologia pode contribuir com as discussões da Geografia. Sendo aquela, segundo o Dicionário Robert, um estudo crítico das ciências destinado a determinar a sua origem lógica, o seu valor e o seu alcance. Os oito primeiros capítulos reconstituem a natureza e a construção das geografias aplicadas no mundo tradicional e a evolução das geografias científicas. Os capítulos 9, 10 e 11 evocam os debates epistemológicos que a disciplina alimentou desde o final do século XIX. No último capítulo, são elaborados questionamentos dirigidos aos geógrafos.
Na introdução do livro, a epistemologia é colocada sob a perspectiva centrada na análise das práticas científicas dos geógrafos, procurando não estabelecer prescrições universais: explora o “saber-fazer”. O autor divide a geografia em duas: a da vida diária, que reúne os saberes-fazeres do bom senso para se dirigir, situar-se e tirar partido dos lugares; e a da reflexão científica. Partindo desta, os geógrafos definiram diversos esquemas de explicação ou de interpretação, como: a ideia de meio; o papel da posição; olhar a Geografia como uma ciência das combinações, das estruturas ou dos sistemas; analisar o papel da interpretação das distribuições em termos de relações entre os indivíduos, levando em conta os fundamentos simbólicos da organização social.
No primeiro capítulo, fala-se que as formas e conteúdos das geografias pré-científicas ou etnogeografias variam de uma cultura a outra; opondo, esquematicamente, as geografias vernaculares dos quadros descritivos, já que as primeiras são transmitidas pela palavra, enquanto os segundos foram redigidos por especialistas para atender às curiosidades do público culto ou às necessidades das administrações estatais.
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Segundo Claval (2011, p. 31) “Para que os membros de uma sociedade disponham de conhecimentos geográficos satisfatórios em matéria de orientação, é preciso que haja uma comunicação sobre o que foi visto. Para consegui-la, os povos batizam o terreno”.
A criação de uma grade de toponímias tem efeitos consideráveis na comunicação entre os sujeitos, pois permite falar dos lugares mesmo quando estamos longe deles, socializando a experiência do terreno e alargando a esfera de deslocamentos e das trocas além daquilo que já foi percorrido pelo indivíduo ou pelos seus próximos.
Nas culturas vernaculares, o trabalho de exploração e de aprendizado dos meios aos quais se dedicavam as pessoas lhes permitia acumular conhecimentos frequentemente ricos e matizados sobre os diversos lugares ou territórios que compunham o espaço frequentado.
Porém, nos grupos em que os saberes são vernaculares, a circulação dos conhecimentos geográficos mais importantes permanece limitada a círculos frequentemente estreitos. Desde que se multiplicam as informações das quais se necessita, o recurso a cadeias intermediárias locais se revela insuficiente. Objetivando superar este déficit, surgem os quadros geográficos que se baseiam num inventário, o mais completo possível, dos lugares que compõem o espaço que o poder controla, enriquecendo a grade de localizações de informações indispensáveis à boa gestão do território.
No segundo capítulo, é colocado que a aptidão em se orientar e se reconhecer constitui a base de toda a démarche geográfica, vernacular ou científica. No entanto a geografia científica difere das geografias vernaculares e daquelas que eram usadas nas grandes sociedades do passado por utilizar um sistema de coordenadas universalmente válido.
“Conhecendo então a latitude e a longitude de um ponto, sua posição é determinada e pode ser transportada para um plano utilizando um sistema de projeção. A carta constitui uma grade de localização cientificamente elaborada, ela não se apresenta, entretanto sem ligações com as grades de localização das sociedades tradicionais” (CLAVAL, 2011, p. 59)
O domínio do geógrafo é, primeiramente, o que se pode ver na superfície da Terra. A geografia é uma ciência de observação. Os objetos que retêm a atenção do pesquisador são diretamente perceptíveis. Porém os objetos que retêm a atenção dos geógrafos não estão na mesma escala. Analisar uma paisagem é, pois, apreender o real em diversas escalas. A observação se apoia, sobretudo, em realidades ao ar livre, imediatamente visíveis ao caminhante.
O que o geógrafo procura ver na paisagem não é a localização de tal ou tal objeto específico, mas a distribuição dos objetos de uma mesma família na superfície terrestre. Para
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apreender as configurações espaciais dos dados recolhidos em escalas em que não se pode normalmente lê-los, os geógrafos têm, por conseguinte, de recorrer à cartografia temática.
Desse modo, a geografia transforma, as relações dos grupos com o espaço: permite tornar o real conforme aos desenhos ou planos de antemão imaginados e preparados, fornecendo aos responsáveis militares, econômicos ou políticos a possibilidade de modelar o território de maneira muito mais acordada e muito mais sutil do que era até então possível.
O terceiro capítulo aborda a Geografia como narrativa. Os geógrafos procuram descrever o mundo, desejando restituir com exatidão as informações que recolheram e as reações que experimentaram diante de seus descobrimentos. Após a Reforma e a Contra Reforma, uma nova concepção da geografia se impõe, buscando contar como o homem transformou a Terra para fazer dela realmente sua morada, a história da domesticação das espécies cultivadas e dos animais.
Para o autor, construir a geografia como uma grande narrativa histórica, como uma epopeia, restringe dramaticamente seu campo. Essa forma de expressão é, com efeito, incapaz de dar conta da diversidade das paisagens, dos lugares e das populações que ali se encontram. Claval (2011) acredita que é outro gênero literário, o quadro geográfico, que permite fazê-lo.
“Traçar o quadro geográfico de uma região é desenhar as divisões que se podem ali reconhecer e destacar suas características específicas. A escrita de um quadro geográfico supõe a conciliação de exigências contraditórias, a visão por grandes conjuntos e a leitura dos fenômenos à escala onde as pessoas os percebem normalmente”. (CLAVAL, 2011, p. 95)
“A descrição de cada conjunto territorial permite definir o que caracteriza verdadeiramente cada lugar, cada região, na medida em que destaca como as particularidades naturais a circulação, o tipo de hábitat e o estilo da vida social mutuamente” (CLAVAL, 2011, p. 98-99)
Como gênero geográfico, o quadro se apoia sobre um trabalho prévio de tratamento dos dados (para regionalizá-los) e sobre a reflexão teórica (para compreender como os fatos relatados se articulam entre eles no nível local e global).
No quarto capítulo, afirma-se que a geografia implica na análise dos encadeamentos responsáveis pela organização do mundo, pois a ambição daqueles que a praticam sempre foi ultrapassar a simples evocação dos lugares. A geografia torna-se científica a partir do momento em que toma as condições do ambiente como uma das causas possíveis da diversidade dos homens, de seus modos de vida, de suas instituições e de suas culturas.
Para Hipócrates, as relações entre o ambiente e o ser humano são deterministas, mas não são suscetíveis de serem analisadas em termos de processos ou de mecanismos, pertencendo assim mais ao registro de correspondências.
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“No decorrer do século XVII, surge o ambientalismo sensualista, que abandona a ideia de que o espírito é pré-formado ao nascimento”. (CLAVAL, 2011, p. 119)
“O ambiente dos sensualistas é, sobretudo, o das formas construídas e das cidades. Estando na origem das primeiras pesquisas de geografia social das cidades”. (CLAVAL, 2011, p. 122-123)
Segundo Claval (2011), o impacto do ambientalismo herderiano na geografia foi muito mais importante e mais direto, na Alemanha em especial, que o dos modelos sensualistas. Herder, colocando a tônica mais sobre as harmonias que se estabelecem entre o ambiente e as atitudes/mentalidades daqueles que estão ali inseridos, afirma que existe uma relação sutil entre língua, imaginário social ou formas literárias e espaço no qual o povo vive.
É ressaltado, no capítulo, o papel do evolucionismo darwiniano, que coloca o ambiente desempenhando um papel ativo na seleção dos seres, para o desenvolvimento da Ecologia e da Geografia. O evolucionismo darwiniano torna a ideia de meio ou de ambiente em conceito chave da última. No fim do século XIX, surge a ideia de gênero de vida que caracteriza cada meio como um reservatório de possibilidades, as quais os homens aprendem pouco a pouco a utilizar.
No quinto capítulo, fala-se dos conceitos sítio, situação e posição, os quais os geógrafos utilizam para descrever e justificar o funcionamento dos espaços habitados. Sítio é usado para analisar as relações mais próximas; já situação implica na análise de relações inter-escalares. A análise de situação coloca em destaque as influências exercidas em uma localidade, uma região ou um país por outros lugares, regiões ou países. Ressalta-se o papel de Varenius na transformação da concepção de espaço, sendo ele o primeiro a romper com os princípios herdados da Antiguidade. O sistema de Varenius coloca a tônica sobre o global.
“A Geografia Pura procura na natureza os princípios de uma divisão liberada das contingências da história. A ideia de situação é, doravante, triplamente associada à de geografia natural.” (CLAVAL, 2011, p. 150-151)
“A dimensão natural das análises de situação precisa-se com Alexandre Humboldt, que multiplica as maneiras de regionalizar a Terra, apoiando-se em critérios naturais. Enquanto Ritter codificou o estudo das situações e assimilou a ideia de que a história dos povos reflete os meios onde vivem. A análise de situação relaciona os fenômenos locais ao que se passa na escala do planeta”. (CLAVAL, 2011, p. 151-153)
Segundo o autor, a geografia que Ratzel elabora é a primeira a atribuir um lugar essencial ao evolucionismo, pois confere ao ambiente um papel negativo, porém decisivo no processo de organização social. Dessa forma, torna-se necessária a constituição de uma Antropogeografia, de uma geografia humana concebida como análise das influências e
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condicionantes exercidos pelo meio sobre a vida dos grupos. Já Vidal de La Blache concebe a geografia humana como uma ecologia das sociedades humanas, insistindo na abordagem dos gêneros de vida e defendendo que o mesmo meio pode ser valorizado de maneira diferente de acordo com os níveis técnicos nos quais as sociedades se encontram.
No sexto capítulo, a Geografia é abordada como estudo das combinações. Os geógrafos acreditavam que o estudo das relações entre os grupos humanos e o meio fornecer-lhes-ia o esquema geral de interpretação de que necessitavam. Percebe-se que a ocupação e a valorização dos meios naturais comparáveis podem variar consideravelmente. A geografia humana torna-se a ciência das configurações espaciais e das formas de organização regional.
Segundo Claval (2011), os geógrafos acolhem bem a ideia de região natural. Com o surgimento das ideias de região histórica, regiões agrícolas, regiões industriais, regiões polarizadas e de região geográfica, pode-se pontuar que a démarche regional apreende simultaneamente o suporte natural, as formas de ocupação dos solos e as atividades que os homens desenvolveram no seio de um conjunto territorial, voltando-se para caracterizar cada conjunto pela combinação das formas observadas.
“A interpretação étnica de Meitzen explica as estruturas agrárias invocando as estruturas étnicas. Já a geografia de Demangeon implica na consideração das concepções de mundo e das técnicas de organização do espaço daqueles que as utilizam. Enquanto para Braudel os elementos do meio são alterados pelo movimento da história, sendo uma análise duplamente estrutural”. (CLAVAL, 2011, p. 171, 178, 182)
No sétimo capítulo, é abordada a mudança na concepção de espaço geográfico para os geógrafos de meados do século XX. O espaço se tornou um conjunto de distâncias e superfícies. Nessa época, os geógrafos procuram tornar a sua disciplina aplicável, emprestando conceitos básicos da economia espacial. A utilização da teoria dos lugares centrais de Christaller pelos geógrafos é um exemplo típico da mudança de perspectiva que toma lugar na geografia. “A nova geografia faz-se quantitativa. Esse novo tipo de démarche permite à geografia estabelecer leis”. (CLAVAL, 2011, p. 194)
A partir dos anos 1950-1960, os geógrafos insistem nos fenômenos de atração de gravitação, os modelos gravitacionais são ligados ao progresso estatístico. Esses modelos permitem mapear os potenciais de população; mostrando quanto diferem nas localizações centrais e nas regiões periféricas. Nesse período, também surge a teoria do crescimento polarizado que considera a importância dada aos circuitos de informação, sendo estes essenciais na organização do espaço, destacando-se Hägerstrand.
No oitavo capítulo, fala-se da abordagem cultural em geografia. “No âmbito das epistemologias positivistas, naturalistas ou neopositivistas que dominaram por muito tempo
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a geografia, era ignorada a dimensão subjetiva da relação entre o homem e o ambiente”. (CLAVAL, 2011, p. 219)
“A fenomenologia transformou as perspectivas dos geógrafos que a descobrem porque lhes revelou que os lugares não são pontos anônimos num espaço neutro; a Terra não é uma superfície geométrica, é feita de meios físicos, onde a vida está por toda parte presente e os homens moldaram à sua imagem”. (CLAVAL, 2011, p. 222)
Para Claval (2011), a partir do momento em que os geógrafos partem da experiência que as pessoas têm do espaço, a idade e o sexo tornam-se variáveis chaves. O novo olhar geográfico dá a mesma atenção à experiência do religioso/sagrado e da cotidianidade laica. A paisagem não é mais talhada por aquele que a habita ou a visita, faz, num certo sentido, parte de seu ser.
Essa nova corrente dá importância ao fator simbólico das paisagens, aos círculos de intersubjetividade, que estão associados aos círculos de inter-comunicação, e às representações, que são uma criação social ou individual de esquemas relevantes do real. A partir desse momento, os geógrafos interessam-se pelos valores.
No capítulo nove, faz-se uma retrospectiva dos grandes debates epistemológicos de 1890 a 1970. “A geografia humana clássica nasce na época em que o evolucionismo triunfa; tenta responder algumas das perguntas fundamentais que ele coloca. Já a perspectiva que se impõe na França é diferente, a geografia francesa não é determinista. Vidal de la Blache coloca a tônica na relação entre comportamentos coletivos e a distribuição dos estabelecimentos humanos, muito mais do que a influência do ambiente. A abordagem regional também é uma característica dessa época”. (CLAVAL, 2011, p. 253-255)
Segundo o autor, o período entre as duas guerras mundiais é muito mais marcado pelo alargamento do campo da disciplina que pelo seu aprofundamento. Nos novos contextos, as associações territoriais refletem cada vez menos o peso dos condicionantes naturais, gerando assim um mal-estar na disciplina, que é muito sensível na França. Cholley questiona a abordagem regional até então utilizada, embora não oferecesse os meios que permitiriam tornar a disciplina aplicável. O mal-estar da geografia desenvolve-se na França, com o desaparecimento de certas orientações da pesquisa, a fim de evitar os ataques que os intelectuais do partido comunista desencadeariam sistematicamente contra aquelas.
Porém muitos geógrafos franceses interpretavam de outra maneira o mal-estar que conhecia a disciplina. Esse mal-estar provinha da própria dinâmica de investigação geográfica, a especialização. A disciplina passa por um processo de restruturação nos anos 1940 e 1950, colocando a tônica sobre os problemas de interação e de circulação; o recurso à economia espacial; a mobilização de métodos quantitativos de análise. “Apesar de emprestar
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conceitos e modos de raciocínio de outra disciplina, o que trazem de original é a realização de toda uma nova metodologia para validar as deduções teóricas, sendo de acordo com as normas do positivismo lógico”. (CLAVAL, 2011, p. 270-271)
O capítulo dez aborda os grandes debates epistemológicos dos anos 1970 e início dos anos 1980. “As questões na moda dedicavam-se ao sentido dos lugares, tocavam igualmente na ausência da dimensão crítica da nova geografia, pois esta mostrava como o mundo funciona, mas não se preocupava em fazê-lo funcionar de maneira justa eliminando as desigualdades”. (CLAVAL, 2011, p. 277)
Segundo Claval (2011), nessa época, inicia-se o trabalho efetuado por equipes pluridisciplinares. Estas obrigam cada um dos pesquisadores a tornar mais legíveis as suas orientações e mais claros os métodos sobre os quais se apoia a sua démarche. Outra novidade é o surgimento das reflexões sobre territorialidade e ordenamento do território, que se voltam para a maneira como os homens percebem os fatores naturais e as forças por eles condicionadas.
Ressalta-se o papel do Marxismo no desenvolvimento da Geografia desse período, porém diferente daquele que teve após a Segunda Guerra Mundial, liberando a geografia política e colocando em moda a discussão de temas como o de subdesenvolvimento.
“O estruturalismo está em moda, pois se havia tomado consciência da permanência durante longos períodos de certos traços da vida social e da organização do espaço. A mudança que ocorre nos geógrafos dessa época é o desejo dar uma dimensão teórica que faltava ao estruturalismo do início do século XX”. (CLAVAL, 2011, p. 285)
O capítulo onze aborda a ampliação dos debates epistemológicos na era do pós-modernismo e do pós-colonialismo. “No decorrer dos anos 1980, os debates epistemológicos ganham uma nova feição no mundo anglófono. Resultam de um questionamento da ideia de progresso, da evolução das ciências sociais e do novo prestígio que gozam as humanidades. É neste contexto que se desenvolve a crítica à modernidade, rompendo-se com a ideia de racionalidade. Feyerabend descobre que os critérios que permitem validar os resultados não são ancorados numa razão abstrata e eterna”. (CLAVAL, 2011, p. 299, 305)
Segundo o autor, a crítica da modernidade deve a Frederic Jameson o impacto que teve na geografia, destacando que uma das características da evolução contemporânea é dar ao espaço um lugar que a modernidade lhe negava. Para a virada linguística, a experiência humana e a sua relação com a realidade não pode ser pensada fora da mediação da linguagem. Surge assim a ideia de que o espaço é construído a partir das representações.
“A corrente pós-colonial coloca a geografia como uma ciência imperialista. Propõem ao mesmo tempo, uma nova leitura do outro por muito tempo depreciado enquanto
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colonizado. A geografia pós-colonial tenta compreender o porquê de as sociedades locais desagregarem-se na presença dos novos visitantes e o que permite à Europa alargar a sua influência. A corrente pós-colonial interessa-se em fazer uma geografia dos contatos entre culturas. Outro debate que caracteriza a geografia pós-moderna é o de paisagem, ampliando a visão das relações que os homens tecem com o meio onde vivem”. (CLAVAL, 2011, p. 311-315)
O capítulo doze fala dos debates epistemológicos que nascem das questões colocadas pelos que desenvolvem as ciências ou que comparam os seus métodos, alimentando-se dos modelos utilizados pelas outras disciplinas ou pela reflexão filosófica.
“Durante algum tempo os geógrafos se seduziram só pelo tema marxista da economia dominante, ou aquele contemporâneo, do poder como instância chave. Aqueles aproveitaram mais das reflexões kantianas sobre o espaço e o tempo, e também participaram, independentemente do que defendiam, às grandes discussões sobre determinismo e liberdade”. (CLAVAL, 2011, p. 350)
“Pode-se, por conseguinte, compreender as orientações da geografia, já que os debates abertos pelos filósofos ou pelos especialistas de outras disciplinas eram ignorados. Até a aproximação contemporânea com as humanidades, as contribuições externas permaneceram sempre bastante limitadas”. (CLAVAL, 2011, p. 351)
O último capítulo do livro fala de imaginação geográfica. “O sucesso dessa noção deve-se a Derek Gregory. Para ele as sociedades dotam-se sempre de representações (‘de imaginações’) que lhes permitem pensar a organização política do mundo no qual evoluem e o caminho que segue a civilização”. (CLAVAL, 2011, p. 353)
Para o autor, a imagem de um mundo desenvolvido e de países à deriva se impõe, conhecendo-se a plenitude das sociedades nacionais. Esses fatos são a evolução das categorias que o Ocidente imaginou para pensar os sistemas políticos, as relações que existem entre si e as atividades econômicas que deles se desenvolvem. Mas a imaginação geográfica preocupa-se também com as culturas e a evocação das civilizações. O conhecimento da geografia é indispensável a quem quer reconstituir o percurso da humanidade.
“A geografia não está diretamente associada à fabricação das ideologias clássicas, mas não é poupada, dado que é ao povo constituído em nação que retorna a responsabilidade de assumir o progresso e de permitir o desenvolvimento da humanidade. A associação da geografia com as tendências dominantes das ideologias do final do século XIX e princípio do século XX é, por conseguinte, estreita. Atualmente, as ideologias do progresso, e o papel da nação que lhes era associado estão em crise. Outras ideologias, como o ecologismo e o multiculturalismo, asseguram a continuidade dessa relação. O crescimento daquelas valoriza
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os estudo que os geógrafos dedicam aos lugares, aos territórios e ao enraizamento”. (CLAVAL, 2011, p. 367-368)
Epistemologia da Geografia de Paul Claval é um livro de extrema relevância para os estudantes e professores que se dedicam à ciência geográfica, pois aborda temas importantíssimos a respeito da epistemologia da geografia, contextualizando com os acontecimentos e debates epistemológicos de outras disciplinas em vários momentos históricos.
Com a conexão que há entre os capítulos, o autor deixou claro que, quando aparecem novas correntes e ideologias, elas vêm almejando a ruptura com a anterior e até mesmo rebuscando características das mais antigas.
O entendimento da epistemologia ajuda a compreender as abordagens teóricas e os procedimentos metodológicos utilizados ao longo dos anos pelas diversas correntes da ciência geográfica. Sem esquecer a importante contribuição das geografias vernaculares ou pré-científicas, que apesar de não encaixarem-se nas démarches científicas, estas utilizam-se das primeiras para a sua consolidação. Por fazer esse vínculo entre essas duas formas de geografias, essa obra caracteriza-se inovadora.
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SOBRE A AUTORA IZABELA CRISTINA GOMES DA SILVA - É Bacharel em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco. Cursa o Mestrado em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco. ______________________________________________________________________