quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Filosofia para crianças na prática escolar

Os organizadores deste volume tem uma preocupação especial com a formação dos professores que estarão trabalhando a filosofia com as crianças
Por Wanderson Flor do Nascimento, Graduando em Filosofia pela Universidade de Brasília (UnB)

Filosofia para crianças na prática escolar - Coleção Filosofia e Crianças. Vol. 02
Autor: Kohan, Walter Omar e WAKSMAN, Vera (organizadores)
Editora: Vozes
I.S.B.N.: 8532621295
Lançamento: fev, 1999

A filosofia, historicamente, ou é vista como uma prática solitária, ou reservada aos meios acadêmicos, salvo raras exceções. O trabalho de junção da prática educativa na escola e da prática da filosofia é esboçado neste texto de uma maneira acessível a agradável ao leitor que se interesse por filosofia e educação.

Este é um texto que contém uma seleção de artigos produzidos por pesquisadores das interfaces entre educação e filosofia, que são também educadores que se preocupam com a educação como processo de formação de seres humanos imersos em um mundo onde o pensar crítico se faz cada vez mais necessário. Os organizadores deste volume tem uma preocupação especial com a formação dos professores que estarão trabalhando a filosofia com as crianças. Walter Kohan é professor da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e coordena o "Projeto Filosofia na Escola", junto a escolas públicas do Distrito Federal. Vera Waksman trabalha em Buenos Aires e La Plata com crianças e na formação de professores de filosofia.

Em seu conjunto o texto oferece uma reflexão sobre a inserção da prática da filosofia no cotidiano escolar. A aula de filosofia é tematizada em seus diversos aspectos, desde o planejamento da aula para as crianças pequeninas até os critérios de avaliação. Os artigos foram fruto de vários anos de experiência de seus autores, inclusive do pioneiro no trabalho de filosofia para crianças, Matthew Lipman. Quase todos os artigos, trazem ainda uma referência bibliográfica que ajudará no aprofundamento das questões que mais despertarem interesses.

O primeiro artigo do livro foi escritos pelos professores Tom Jackson e Linda Oho, que desenvolvem a vários anos um interessante trabalho com o programa Filosofia para Crianças em Honolulu, no Havaí. No texto se encontram 34 sugestões de atividades que visam introduzir as crianças pequeninas na prática filosófica em comunidade. A preparação do espaço, as condições de organização da própria turma e o contato primeiro com a metodologia que será utilizada daí em diante são trabalhadas sob a égide de experiência e reflexão sobre a experiência. Estas propostas, apesar de terem sido pensadas para o contexto do Havaí, podem ser úteis para professores que estejam iniciando o trabalho filosófico com as crianças.

O segundo artigo, escrito pelo professor Walter Kohan, desenvolve alguns elementos essenciais à implementação do trabalho de filosofia com as crianças na sala de aula. Reflexões sobre o espaço social da escola e sobre os momentos da aula, como o trabalho com os diversos tipos de texto, a problematização do texto, a discussão filosófica e a avaliação são tratados de maneira objetiva e clara, como um marco para os trabalhos que não terão como norte as novelas e manuais do programa Filosofia para Crianças de Lipman e também como um apoio adjacente aos professores que trabalham com o referido programa.

O terceiro artigo, escrito pelo criador do programa Filosofia para Crianças, Matthew Lipman, oferece uma reflexão e fundamentação sobre duas táticas utilizadas no programa criado pelo professor, que são os planos de discussão e os exercícios filosóficos. Planos de discussão são como que orientadores, constituídos por situações problematizadoras ou perguntas, que ajudam ao professor a facilitar a discussão entre as crianças, visando, a construção de conceitos através de alguns instrumentos argumentativos. Os exercícios filosóficos visam o desenvolvimento de habilidades de raciocínio assim como o seu uso otimizado. Lipman propõe que seja utilizado como texto para a problematização a história da filosofia (re-construída especialmente para as crianças: novelas filosóficas) e assim poder trabalhar tanto os exercícios como os planos de discussão. Este artigo é um valioso apoio aos professores que desejam utilizar ou utilizam dos manuais e novelas lipmanianas, para que possam ter uma compreensão teórica mais aprofundada do programa Filosofia para Crianças.

O quarto artigo foi escrito pelos professores Marie-France Daniel, Louise Lafourtune, Richard Pallascio e Pierre Sykes que desenvolvem uma proposta interdisciplinar para o trabalho de filosofia com as crianças no Canadá. Neste texto há uma reflexão sobre ensino da matemática e em que pode a filosofia e seus métodos contribuir para evitar a absorção do conteúdo matemático pela dita "decoreba". A partir da experiência destes educadores (alguns matemáticos e outros filósofos) com o ensino da filosofia para as crianças e para os adolescentes e da matemática como o chato "bicho-papão" surgiu a idéia de um trabalho que tornasse a relação dos alunos com matemática mais agradável e mais consistente. Este artigo traz ainda algumas partes de textos que são usados no trabalho filosófico-matemático com as crianças e os adolescentes. Uma fascinante proposta que expõe o trabalho com dois "mitos do intransponível" na educação: a matemática e a filosofia.

Um dos mais delicados assuntos em educação é ao processo de avaliação. Este é o tema do artigo da professora mineira Angélica Sátiro. Partindo da natureza valorativa da avaliação, da possibilidade da dimensão do prazer no processo avaliativo e da presença do olhar avaliativo que o homem lança sobre suas ações e sobre o mundo em muitas situações de sua vida, a autora vai desenvolver uma análise da presença da avaliação no processo educativo e como a filosofia se insere neste processo e ainda mais, como e porque avaliar a atividade filosófica com as crianças. Há no texto vários exemplos de estratégias de avaliação que ilustram a perspectiva de as crianças também são sujeitos no processo avaliativo.

Este livro é uma excelente contribuição para os professores e estudiosos do trabalho de filosofia com as crianças, pois além de importantes aportes teóricos - com concisas análises, críticas e propostas sobre o trabalho filosófico-pedagógico nas escolas - de professores de reconhecida experiência no assunto, o livro tem sugestões práticas baseadas na prática, em sala de aula, da filosofia.

Revista de Pedagogia - UNB

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