domingo, 10 de julho de 2011

Nós e os outros: a reflexão francesa sobre a diversidade humana


TODOROV, Tzvetan. Nós e os outros: a reflexão francesa sobre a diversidade humana,v.1.Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1993,215 p.

José do Nascimento Junior
Bacharel em Ciências Sociais
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Este livro escrito por Todorov - búlgaro, pesquisador do Centre National de Ia Recherche Scientifique (CNRS) - apresenta uma reflexão do processo de construção histórica de conceitos, tais como: etnocentrismo, cientificismo, relativismo, raça e racialismo, à luz de autores franc,eses dos séculos XVII e XX que contribuíram para este pensar. Como propõe Todorov, autores como
Montaigne, Renan, Lévi-Strauss etc, permitem-nos pensar a relação entre Nós - um grupo social determinado - e os Outros - todos aqueles que não têm a mesma identidade que Nós.
Ao confrontare dialogar com esses autores e conceitos, Todorov está preocupado em demonstrar como, para cada conceito forjado historicamente, existe uma ideologia. Processo que, contextualizado dentro de determinado período da história, permite ver como os termos se tomaram idéias em determinado momento.
Perpassa todo o livro a tensão entre as formulações de caráter universalista e relativista, evitando-se cair nos extremos "do monólogo ou da guerra". Estamos diante da discussão não apenas da diversidade de grupos e opiniões, mas também da questão sobre a existência,ou não de valoreslnoI1nas universais ou particulares que marcam nossas ações.
A recuperação destes temas e autores realizada por Todorov não deve ser percebida como mais uma história do pensamento. Precisamos contextualizá-Ia. Por que um intelectual búlgaro, morador na França, faz um exercício de recuperação destes autores e temas? O atual contexto francoeuropeu dos discursos nacionalistas - a exemplo do Le Pen na França pedindo restrições aos estrangeiros -, coloca-nos diante da retomada dessas temáticas.
O livro de Todorov nos possibilita perceber que estes discursos são, de tempos em tempos, atualizados, em particular dentro da tradição do pensamento rancês. Os europeus ocidentais e os franceses em particular sempre tiveram um olhar privilegiado para o restante do mundo, ou seja, um olhar hegemônico, um olhar etnocêntrico. É neste contexto que se pautam, para as ciências
humanas, as temáticas do etnocentrismo/relativismo, raça/racismo.
A opção por dialogar dentro dessa diversidade de pensamento traz ao texto inúmeras citações sem tomá-Io pesado, possibilitando também ao leitor se posicionar perante o tema ou o autor em questão. Para aqueles que não se satisfazem com a abordagem tradicional destes assuntos, o livro oferece um aprofundamento da discussão entre as ideologias universalistas, que problematizam o que é ser da espécie humana, e relativistas que enfatizam as diferenças constitutivas dos individuos. A não exclusão de nenhuma dessas abordagens é que toma esse livro uma leitura instigante.
Na continuação desta reflexão são recuperados outros temas da filosofia política e da história como nações e nacionalismo, o exótico, no diálogo com Tocqueville, Michelet, Chateaubriand, etc, o que cria uma expectativa para a leitura do segundo volume da Reflexão francesa sobre a diversidade humana, a ser publicado. Todorov imprime um olhar antropológico sobre todos esses temas e autores, consegue, como diz Lévi-Strauss sobre os antropólogos, tomar-se "o astrônomo das ciências sociais", ou seja, a partir da constelação de temas abordados consegue ter uma visão particular sobre a di versidade humana.
Assim, possibilita a construção democrática plural da convivência do Nós, que neste contexto são os europeus, e os Outros que somos Nós.

Revista Horizontes Antropológicos

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