terça-feira, 27 de janeiro de 2009

O Filho Eterno - Cristovão Tezza

Filho pródigo
Pertinente auto-análise e objetividade pontuam com qualidade corajoso livro de Cristovão Tezza
por Diego Braga Norte
[06/01/2009]


Ganhador dos prêmios Portugal Telecom, Bravo!, APCA [Associação Paulista dos Críticos de Arte] e Jabuti [categoria Melhor Romance], O Filho Eterno, de Cristovão Tezza, chega coberto de louros. “Tezza dá ao romance do Brasil uma maturidade há muito desejada e pressentida”, diz a Carta Capital. “Condenável no cotidiano, a crueldade pode ser uma virtude literária. Ela é a grande qualidade de O Filho Eterno”, palavras da Veja. “Isento de qualquer traço de sentimentalismo ou comiseração, o discurso do narrador sobre o pai deste filho-eterno surpreende”, Estadão. Já para o Le Monde Diplomatique, “O equilíbrio faz desse livro uma jóia de beleza e sensibilidade, algo muito positivo”.

Poderíamos passar um bom tempo pinçando na imprensa elogios ao romance. Há muitos, no exterior inclusive. Já publicado em Portugal e na Itália, o premiado filho eterno mostra-se também rebento pródigo no mundo editorial. O livro será lançado, agora em 2009, na França, Espanha, Austrália, Nova Zelândia e Holanda. São poucos os atuais escritores brasileiros que andam levantando tanto interesse dos leitores estrangeiros. Com seu blockbuster, Tezza entra num seleto grupo.

Afirmar que o livro é sobre a difícil relação de um pai com um filho com síndrome de Down é um reducionismo preguiçoso que não consegue, nem de longe, abarcar a complexidade da narrativa. A história, de fato, nasce junto com a criança deficiente. Na década de oitenta, a síndrome de Down, causada pela trissomia do cromossomo 21, era um conceito restrito aos círculos médicos. Para a sociedade, e para o pai, o garoto era mongolóide, retardado. Partindo do choque causado pelo nascimento de Felipe, Tezza faz uma auto-análise biográfica e literária de sua vida. O romance é, antes de mais nada, corajoso.

Além de corajoso e sincero, a narrativa é bem escrita e habilmente construída. Narrando em terceira pessoa para falar de si mesmo, o autor confessa seus pecados e virtudes ao longo do seu percurso para se tornar escritor e pai. Tezza recentemente admitiu que Juventude, romance autobiográfico de J.M. Coetzee, o inspirou. Nessa obra, o escritor sul-africano também se utiliza da narrativa em terceira pessoa para falar da própria vida.

Ao descortinar os pensamentos do protagonista, o narrador nos mostra um escritor consciente de seu potencial, no entanto, um pouco inseguro, cínico e prepotente. Como pai, o protagonista revela-se ora cruel e sádico, ora incapaz e irresponsável e ora diligente e apaixonado pelo seu filho especial, uma eterna criança aprisionada em seus próprios limites intelectuais.

Ao decorrer dos capítulos, as peripécias e dificuldades do pai para criar e conviver com seu filho são a menor parcela. A parte preponderante do livro é a vida do escritor, esta também repleta de peripécias e dificuldades para se firmar. Da juventude num grupo de teatro alternativo à temporada na Europa, trabalhando clandestinamente em Portugal e na Alemanha, tudo se apresenta com um prólogo para o que estaria por vir: a carreira literária. Em Curitiba, entre bares, mudanças e perrengues financeiros e emocionais, o protagonista consegue, enfim, a estabilidade ao passar num concurso para professor universitário. Antes, o escritor alternava períodos entre pequenos trabalhos [correções, revisões e artigos] ou sendo sustentado pela sua mulher – retratada com extrema discrição.

Seca, fria e desprovida de sentimentalismo, a história ganha corpo e cresce em momentos importantes e pontuais. Seja nas evocações do passado do escritor ou nas pertinentes observações sobre pequenos atos cotidianos de seu filho, somos tentados a ler para saciar nossa curiosidade. O filho cresce. O escritor também. Ganha o leitor.


O Filho Eterno
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Por Cristovão Tezza
Record
224 págs

Revista Paradoxo

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