quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

A música entra em cena: o rap e o funk


A música que humaniza
Livro aborda o funk e o hip-hop como meios de ressocialização dos jovens da periferia

Denis Weisz Kuck

O rap e o funk são uma das mais fortes ferramentas de auto-afirmação e busca de identidade para jovens pobres da periferia de Belo Horizonte. Este é o argumento por trás de um livro recém-lançado por Juarez Dayrell, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A música entra em cena: o rap e o funk na socialização da juventude é uma versão modificada da tese de doutorado que Juarez defendeu junto à Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).

O autor faz um pequeno histórico da chegada do rap e do funk em Belo Horizonte – cidade em que esses gêneros têm menos expressão do que no Rio e São Paulo. Juarez percorre a trajetória de vida e carreira de três grupos de rap (Processo Hip-Hop, Máscara Negra e Raiz Negra), duas duplas funk (Flavinho e Maninho e Marcos e Fred) e um grupo de funk (Os Cazuza). “Queria me aproximar da realidade dos jovens da periferia, conhecê-los na concretude de sua existência de humanização e desumanização, na qual se produzem e são produzidos como sujeitos”, diz Juarez em seu livro.

É esse o diferencial do livro de Juarez: ele procura não apenas estudar como os jovens se relacionam com o funk e o hip-hop, mas também como esses estilos influenciam outras esferas da vida desses jovens – o trabalho, a escola e a família.

Em sua pesquisa de campo com os rappers e funkeiros, o educador verifica que a vida profissional fora da vivência do estilo musical é vista como um fardo, uma obrigação sem interesse que eles precisam manter para obter um mínimo de renda. A escola, encarada como um adiamento da fruição da vida, não atende as reais demandas desses jovens e por isso é abandonada antes de sua conclusão. Já a família é em quase todos os casos um dos pilares na formação desses rappers e funkeiros, sendo a figura da mãe mais importante que a do pai, na maioria das vezes ausente.

Juarez conclui que o funk e o hip-hop são estilos que os jovens pobres escolhem para poder vivenciar mais intensamente sua juventude, em um meio carente que tende a anular a expressão de sua cidadania. São dois estilos democráticos, que possibilitam aos jovens carentes sair da posição de consumidores passivos da cultura – à qual têm dificuldades econômicas de acesso – para se tornarem eles próprios criadores.

Embora a maioria dos grupos e duplas acompanhados por Juarez tenham acabado, e apesar de histórias pessoais como a do funkeiro Rogério, que entrou para o tráfico, o autor avalia como positiva a participação dos jovens estudados no ambiente funk e hip-hop, que ele caracteriza como um “meio pelo qual [eles] exercem o direito de serem jovens”. E retira da sua experiência ao lado dos grupos e bandas um conselho para a sua profissão: “a crise da escola é reflexo da crise da sociedade, e sua superação demanda que nós, educadores, ampliemos nossa reflexão para fora dos muros escolares”.

Para leitores que não tiverem interesse acadêmico pelo tema, o trabalho de Juarez pode soar um pouco longo e às vezes cansativo. No entanto, é uma fonte importante para aqueles interessados no aprofundamento do estudo do estilo funk e hip-hop na construção da identidade dos jovens da periferia.

A música entra em cena: o rap e o funk
na socialização da juventude
Juarez Dayrell
Belo Horizonte, 2005. Ed. UFMG
303 páginas

Revista CIÊNCIA HOJE

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